Um recorte da vida do jornalista Machado de Assis passa a fazer segmento da frente do prédio da Ateneu Brasileira de Letras (ABL), no núcleo da cidade do Rio de Janeiro. Estão representadas em um mural de 150 metros a moradia onde o jornalista morou, no Morro do Livramento, a Rua do Ouvidor, que lhe era tão querida, no núcleo da cidade, sua esposa, Carolina Augusta, a paixão pela música clássica, pela literatura e as reflexões sobre vida e morte.
À esquerda, marcando o início da leitura, a letra M ornamentada, porquê se via no início de livros antigos, que representa também o primeiro trabalho solene do jornalista, porquê tipógrafo.
O ponto medial da obra está em outra paixão do jornalista: o xadrez. Um xeque-mate nas discussões sobre a cor da pele do jornalista. O Machado de Assis preto roteiro na partida um Machado de Assis embranquecido, reafirmando que o primeiro presidente da ABL é um varão preto.
O mural, inaugurado nesta segunda-feira (23), é segmento do projeto Preto Muro, idealizado pelo produtor e pesquisador Pedro Rajão e pelo artista Fernando Cazé. Ao todo, são 62 murais pela cidade do Rio de Janeiro que mapeiam a memória negra por meio da arte urbana.
O artista Fernando Cazé e o pesquisador Pedro Rajão, idealizadores do projeto que mapeia a memória negra na cidade do Rio – Tânia Rêgo/Filial Brasil
Segundo Cazé, nascente mural tem um significado peculiar. “É dando término à história de que Machado era branco. Portanto chega fessa teoria de que ali a gente tem um varão branco, né?. A gente costuma proferir que arte e instrução antirracista trabalham juntos ali. A gente pesquisa o território e ergue monumentos negros de congraçamento com o seu território. Portanto, quando a gente traz o Machado de Assis, a gente não traz cá à toa, traz porque ele foi o primeiro presidente da Ateneu Brasileira de Letras. Um varão preto, do qual se discute até hoje a cor da pele. Portanto, a gente traz essa memória, fincando a teoria, as raízes de que cá tivemos o primeiro presidente preto dentro da instituição.”
Rajão conta que procurou a ABL para realizar o trabalho e explica que projeto Muro Preto atua com a produção de murais, que, para ele, é a forma de arte mais democrática provável, está nas ruas, gratuita, à vista de quem por ali passa. O projeto identifica importantes personalidades negras e as registra em territórios que fizeram segmento da história e biografia de cada uma.
Chegar à ABL, para Rajão é “uma emoção muito grande. O Machado de Assis é uma das poucas unanimidades nacionais. Portanto, o projeto que está se debruçando a traçar essa cartografia é um nome meio óbvio. Mas a gente queria um lugar de impacto, um lugar que tivesse uma sonância para repetir ainda mais o Machado de Assis, que volta e meia está sendo redescoberto”.
Machado de Assis nasceu e viveu no Rio de Janeiro entre 1839 e 1908. É um dos autores brasileiros mais importante. A obra machadiana é composta por dez romances, 205 contos, dez peças teatrais, cinco coletâneas de poemas e sonetos, e mais de 600 crônicas. É responsável de Memórias Póstumas de Brás Cuba, Quincas Borba, Dom Casmurro, Esaú e Jacó e Memorial de Aires. Foi um dos fundadores e o primeiro presidente da ABL.
Novas gerações
A professora Dandara Suburbana destaca relevância histórica do mural em homenagem ao jornalista Machado de Assis – Tânia Rêgo/Filial Brasil
O lançamento do mural na ABL contou com apresentações e com mesa-redonda com pesquisadores. A professora e pesquisadora Dandara Suburbana foi uma das debatedoras. “Machado de Assis tem uma relevância histórica, porquê grande fundador cá da Ateneu Brasileira de Letras, porquê um varão preto, que traz uma literatura de superioridade para o cenário pátrio e internacional, um dos maiores escritores do mundo”, afirma.“Hoje, quando a gente tem um quadro feito porquê o Preto Muro fez cá, porquê o artista Cazé elaborou, é também dar uma estética e trazer história, historicizar Machado de Assis e toda a sua taxa. Dizendo que sim, pessoas negras escrevem, pessoas negras são intelectuais, pessoas negras têm taxa para a Ateneu Brasileira de Letras, para o cenário pátrio e internacional de saberes e conhecimentos”, enfatiza.
Dandara Suburbana defende ainda a formação de novos leitores e diz que os jovens, ao contrário do que se pensa, querem e gostam de ler. “Hoje a gente tem um siso generalidade, um jargão generalidade de que a juventude não quer ler, de que a juventude não se interessa por escrita, de que a juventude só quer ir para o TikTok, a juventude só quer saber de rede social e Twitter. Isso não é verdade. Inclusive, as redes sociais podem ser aliadas. Temos várias páginas que divulgam literatura negra, que estão falando desse legado, trazendo de maneira divertida, juntando mídias diversas, escrita com o vídeo, com o corpo, com a fala. Portanto, é provável, sim, a gente pensar em reunir.”
Mural aproxima Ateneu Brasileira de Letras da país brasileira, diz o jornalista Godofredo de Oliveira Neto – Tânia Rêgo/Filial Brasil
Presente na cerimônia, o jornalista Godofredo de Oliveira Neto, membro da ABL, diz que o mural é uma forma de a ABL se aproximar da país brasileira. “Machado é a espírito da ABL. A gente existe por razão dele, graças a ele. Portanto, Machado é o resumo da cultura brasileira exitosa, na estética, no teor, enfim, é o grande pensador. Não é só o grande literário, é um pensador. Portanto, nós temos a honra de estar cá servindo o Machado.”