PEC da Blindagem põe Congresso acima da lei - 19/09/2025 - Oscar Vilhena Vieira

PEC da Blindagem põe Congresso acima da lei – 19/09/2025 – Oscar Vilhena Vieira

O termo privilégio está associado à existência de uma regra que beneficia apenas uma pessoa ou grupo de pessoas em detrimento das demais. A PEC da Blindagem, aprovada pela Câmara dos Deputados nesta semana, tem por objetivo consolidar um perverso e extenso regime de privilégios que os parlamentares vêm construindo com o objetivo de torná-los cada vez mais imunes a responsabilidades políticas e jurídicas.

O esquema está fundado em três pilares. Abundantes recursos para campanha, assegurados pelos fundos eleitorais. Crescente controle sobre o Orçamento, por meio de emendas parlamentares. E, agora, a ampliação das imunidades jurídicas, para se protegerem do controle judicial.

Essa empreitada foi colocada em marcha após a proibição pelo STF, em 2015, das doações privadas para campanhas políticas. A reação do Congresso Nacional foi elevar substantivamente os recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Campanha.

Nas eleições de 2022, esses fundos foram responsáveis por transferir aos partidos políticos cerca de R$ 6 bilhões. Isso conferiu aos dirigentes partidários uma enorme autonomia para distribuir recursos para seus aliados, tornando-os extremamente poderosos e independentes.Aproveitando a fragilidade política do governo Dilma, os líderes do centrão vislumbraram uma nova oportunidade de ampliar seu poder sobre recursos públicos, por meio das emendas ao Orçamento.

O esquema que tornou obrigatórias, mas pouco transparentes, as despesas decorrentes das emendas parlamentares tem uma enorme vantagem em relação às outras formas de apropriação de dinheiro público, na medida em que o cobre com um tênue manto de legalidade. Mais do que isso, o arranjo reivindica ser mais democrático, pois transfere aos representantes parlamentares o controle direto sobre a aplicação do dinheiro público.

O fato, porém, é que a conjugação desses dois mecanismos, na forma como são implementados, reduziu sensivelmente os controles da sociedade sobre o Parlamento, alterando ainda o padrão de relacionamento entre o Executivo e o Legislativo.

O pêndulo do presidencialismo de coalizão, em que o Executivo tinha um papel dominante, voltou-se para o Legislativo, que passou a dar as cartas. Isso não seria um problema para a democracia se fosse acompanhado de mecanismos simétricos de responsabilização política e jurídica do Parlamento. O que não ocorre!

Da perspectiva política, o sistema proporcional pulveriza a responsabilidade dos parlamentares pelas escolhas que fazem. Não precisam mais que o governo dê certo para se beneficiarem. São premiados pelas obras realizadas pelas “suas” emendas, mas não são responsabilizados pelo subfinanciamento das políticas públicas. Da mesma forma, são premiados pela lealdade a seus líderes partidários, não pela racionalidade das políticas que promovam.

Para que esse esquema de perpetuação da casta política funcione, no entanto, é necessário afastar os controles jurídicos sobre os parlamentares. Aqui é que entra a PEC da Blindagem.

Entre 1988 e 2001, os parlamentares só poderiam ser processados se houvesse prévia autorização das respectivas casas do Congresso. Esse modelo contribuiu para a mais absoluta impunidade de centenas de parlamentares, acusados dos mais variados crimes. Ao STF não foi concedida autorização sequer para processar um deputado federal acusado de matar e retalhar suas vítimas com uma motosserra.

Se a PEC da Blindagem, agora turbinada pelo voto secreto, for aprovada no Senado, a casta parlamentar, em sua torre de privilégios, ficará definitivamente acima da lei e à margem do controle dos cidadãos.

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