Já virou rotina às quintas-feiras. Monique Rodrigues de Pontes Vilhena, 38, sai um pouco mais tarde de casa, na região do Grajaú (extremo sul), para ir ao trabalho, no Campo Belo, na mesma região de São Paulo. Mesmo assim, leva de 1h30 a 2h para percorrer 14 km de carro até seu emprego na área financeira.
“Como tenho flexibilidade de horário, atraso a saída de casa e a volta para tentar pegar menos trânsito [às quintas]. Mesmo assim, é pesado”, afirma.
A quinta-feira se fixou como o dia com trânsito mais congestionado na cidade de São Paulo neste ano.
Dados da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) mostram que a média de 390 km de lentidão neste dia é a maior durante a semana.
Supera a sexta-feira, até então, tradicionalmente o dia com os principais índices de engarrafamentos na capital paulista —a exceção foi 2023, quando motoristas já sofriam com anda e para às quintas-feiras.
Não que a sexta tenha se tornado um dia tranquilo para trafegar pela cidade. Sua alta média de lentidão, com 381 km, é a segunda maior entre os cinco dias úteis da semana.
“A quinta virou a nova sexta”, brinca Ciro Biderman, professor e diretor da FGV Cidades. “Parece que isso veio para ficar”, diz o especialista em trânsito e transportes.
A mudança no comportamento de motoristas começou gradualmente a partir da pandemia, em 2020, com a consolidação do teletrabalho e educação online —pessoas passaram a trabalhar em casa às segundas e sextas-feiras e, assim, há menos carros nas ruas nestes dois dias.
Tanto que, em 2019, a média de lentidão às sextas-feiras chegava a 537 km, 5% a mais que os 511 km das quintas-feiras.
Isso se reflete em rodovias. Os congestionamentos nos trechos de estradas que desembocam na capital, antes mais duradouros às segundas e sextas, ficaram menos pesado nestes dois dias, apesar de ainda terem longas filas de carros e caminhões, principalmente pela manhã.
Birdeman acredita que as pessoas estão evitando compromissos pessoais às quintas-feiras, como médicos, quando precisam fazer o deslocamento de carro, pois já perceberam que neste dia a chance de ficar preso no trânsito é maior.
“É melhor marcar a consulta para segunda-feira, pois o risco [de demorar para chegar] é menor”, diz, sobre o dia útil com menor média de lentidão, de 287 km.
Motoristas têm se adaptado à nova rotina. Tanto que os finais de placa preferidos para quem paga para escolher a numeração são 1 e 2, quando há restrição de circulação no centro expandido da capital às segundas-feiras por causa do rodízio de veículos.
Dados do Detran-SP (Departamento de Trânsito de São Paulo) mostram que, até agosto, 1.860 proprietários de carros zero-quilômetro na capital escolheram placas com final 1, e outros 1.952, com final 2.
O final 0 (um dos números com restrição de rodízio às sextas-feiras) é o menos procurado, com 529 emplacamentos na cidade entre janeiro e agosto, entre os que escolheram.
Para escolher o final de uma placa, diz o Detran, o dono do veículo precisa pagar uma taxa de R$ 143,34. O órgão de trânsito afirma também disponibilizar até 20 opções de placas com diversos finais, para quem não quer pagar o extra.
Final da placa escolhida
Quantidade
1
1.860
2
1.952
3
1.145
4
985
5
622
6
441
7
659
8
630
9
1.037
0
529
Independente do dia, a CET diz que a prioridade dos agentes de trânsito é com as condições de fluidez e segurança viária. “Medidas operacionais são tomadas para manter o nível de serviço com a mesma qualidade, todos os dias da semana”, afirma.
A sensação é que os congestionamentos têm se aproximado dos índices de 2019, principalmente no miolo da semana. Dados da própria CET mostram que, no mês passado, a média diária de lentidão foi de 421 km —o indicador mede o trânsito apenas em dias úteis.
O número é o maior do ano e para agosto desde 2019, quando o índice atingiu 475 km.
É essa percepção que fez a família de Monique colocar em prática planos de se mudar para a região do Ibirapuera, também na zona sul, de onde ela espera levar 25 minutos para chegar ao trabalho.
“Vamos buscar mais de qualidade de vida, pois neste ano está mais difícil [de rodar pela cidade]”, afirma.
Para Birdeman, usuários do transporte público migraram para o individual e isso reflete nos congestionamentos.
“É uma matemática simples, para diminuir o trânsito é preciso investir mais no transporte público que em obras viárias”, afirma.
A pesquisa Origem e Destino do Metrô, publicada no início do ano, aponta que mudanças de hábitos impulsionados pela pandemia e o aumento na utilização de carros por aplicativo fizeram o transporte individual superar o coletivo na região metropolitana de São Paulo.
Mulheres, por exemplo, puxaram a disparada no uso de motocicleta, também segundo a mesma pesquisa.
“As pessoas devem estar usando menos transporte público para ir ao trabalho às quintas-feiras e isso impacta diretamente nos congestionamentos nesse dia da semana”, diz o diretor da FGV Cidades.
Em nota, a CET afirma que os trabalhos executados pelos agentes de trânsito em campo são coordenados de modo a atender às várias ocorrências, programadas ou intempestivas.