No ritmo atual de aumento de consumo e de perdas na distribuição, o Brasil pode precisar de um acréscimo de aproximadamente 60% no volume de água tratada em 2050. Por outro lado, o impacto das mudanças climáticas nas chuvas pode levar a restrições, com 12 dias de racionamento por ano em média no país —problema que pode chegar a 30 dias em regiões como Norte e Nordeste.
As projeções são de um estudo encomendado pelo Instituto Trata Brasil e feito pela Ex Ante Consultoria Econômica, divulgado nesta terça-feira (28).
Os cálculos também estimam como o aumento da tempera pode impactar no uso de água tratada. Para cada 1°C a mais nas cidades, o consumo pode crescer 24,9% até 2050. O levantamento usa como base de comparação o ano de 2023.
Além disso, o instituto projeta que as alterações na frequência e no volume de chuvas causem uma redução anual de 3,4% na oferta de água. Este é o fator usado para calcular os dias de racionamento.
O volume de água consumido em 2023, segundo o estudo, que usa dados do Sinisa (Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico), foi de 9,9 bilhões de metros cúbicos de água. Para 2050, é esperado um incremento de 30% no consumo, que pode chegar a 13 bilhões de metros cúbicos.
Em 2023, São Paulo liderou no consumo diário per capita, com 173,3 litros por pessoa. No outro extremo estava o Pará, com 54,5 litros. Em 2050, a previsão é que o Amapá dê um salto de 150% e chegue ao topo da lista com 238,4 litros, seguido pelo Rio de Janeiro.
No recorte por regiões, o Sudeste teve 161,2 litros de água por dia, o topo da lista, seguido pelo Centro-Oeste, com 139,2. Já em 2050, as posições se mantêm, com o Sudeste atingindo 195,2 litros por dia por pessoa, e o Centro-Oeste com 169 litros.
A conta do volume adicional necessário em 2050, de 59,3% —ou 10,7 bilhões de metros cúbicos de água— também considera as perdas no sistema de distribuição.
Os dados apontam que esse índice estava em 40% em 2023. Ou seja, quatro de cada dez litros de água tratada são perdidos antes de chegarem à casa do consumidor. O levantamento do instituto prevê uma redução média anual de 0,6% nas perdas.
Até o biênio 2033-2034, o país precisa baixar o índice, segundo norma do Ministério do Desenvolvimento Regional (atualmente das Cidades) de 2021, para 25%. Cálculo do estudo indica que o volume perdido em 2023, de 7 bilhões de metros cúbicos de água, seria suficiente para garantir o adicional de abastecimento em 2050, sem exigir mais dos mananciais.
O instituto também projeta um incremento de 0,96% no consumo a cada 1% no aumento da população. Segundo o IBGE, o país deve atingir o pico de crescimento em 2041, com 217,6 milhões de habitantes, antes de iniciar a queda.
O estudo aponta ainda que o crescimento econômico também pode levar a um aumento da demanda, já que o consumo de água tende a crescer com a renda. A própria universalização do saneamento, com distribuição regularizada de água e tratamento de esgoto, também indica um aumento.
Segundo a presidente do Trata Brasil, Luana Pretto, o principal desafio é equilibrar o aumento do consumo com a redução da oferta. Uma forma de ajudar na tarefa é reduzir as perdas. “E se tenho perda nesse processo, isso afeta todo o equilíbrio. Então, é uma forma de a gente conseguir melhorar a eficiência e conseguir melhorar essa oferta. Se sou mais eficiente na agricultura usando menos água, isso melhora o equilíbrio naquela bacia hidrográfica. Se estou utilizando água de reúso, consigo recarregar aquífero e diminuo um pouco o consumo.”
Para além de obras para redução de perdas e melhorias na eficiência de sistemas e do reuso de água, a executiva também vê uma necessidade de políticas mais integradas nas cidades, de obras de infraestrutura à conservação de florestas e à ocupação nas cidades.
“Se nós chegarmos a esse cenário crítico [em 2050], teremos regiões sem água suficiente para as atividades diárias. É claro que regiões como São Paulo, que têm feito obras e buscado interligação entre diferentes bacias, conseguem mitigar os impactos”, diz a executiva. “Mas há regiões no Brasil em que a população não tem acesso a água tratada. Isso exige investimentos e planejamento, o que, em grande parte das regiões brasileiras acaba não acontecendo.”


