Embora a palavra átomo signifique “indivisível”, em grego, os físicos do século 19 não demoraram para perceber que átomos são compostos de partículas menores: elétrons, prótons e nêutrons.
O modelo do átomo proposto por Ernest Rutherford (1871–1937) era baseado em ideias da mecânica celeste: elétrons orbitando em torno de um núcleo, como minúsculos planetas em torno de um sol microscópico. Mas ele era incompatível com as leis do eletromagnetismo: os elétrons em órbita teriam que emitir energia continuamente, e logo colapsariam no núcleo.
Para explicar por que isso não acontece, Niels Bohr (1885–1962) postulou que apenas certas órbitas são permitidas, cada uma correspondendo a um dado nível de energia. Quando o elétron ganha ou perde energia, pula diretamente de uma órbita permitida para outra, sem passar pelos níveis de energia intermediários, que estão efetivamente proibidos na natureza.
Esse postulado ganhou uma explicação matemática adequada com a introdução da famosa equação de Erwin Schrödinger (1887–1961), cujas soluções descrevem o comportamento de partículas subatômicas a partir de informação sobre o meio em que estão inseridas.
Em casos relativamente simples, como o do átomo do hidrogênio (um único elétron orbitando um único próton), é possível resolver a equação completamente, utilizando ferramentas que os matemáticos desenvolveram desde o século 18. Cada solução da equação corresponde a uma órbita permitida de Bohr, e seus respectivos níveis de energia estão de acordo com as observações experimentais.
Em 1974, um grupo de físicos teóricos na Universidade de Regensburg, na Alemanha, estava trabalhando num problema bem mais complexo: quais são os níveis de energia permitidos para um elétron num cristal próximo de um imã?
Entre eles estava o jovem norte-americano Douglas Hofstadter, da Universidade de Oregon, acompanhando seu orientador na visita à Alemanha. Cinco anos depois, ele alcançaria fama mundial com a publicação do best-seller “Gödel, Escher, Bach”, ganhador do prestigioso prêmio Pulitzer. Mas nesse momento Hofstadter era apenas um estudante de doutorado como tantos outros, “apanhando” para conseguir uma tese.
Matematicamente falando, o problema consistia em encontrar as soluções da equação de Schrödinger do elétron num meio cristalino sujeito a um campo magnético. O que acontece é que nesse contexto a equação é muito complicada, muito mais do que no caso do átomo de hidrogênio! A equipe conseguia resolver alguns casos particulares simples, mas não tinha ideia de como avançar nos casos realmente relevantes do ponto de vista da física.
Incapaz de acompanhar os raciocínios matemáticos dos demais, Hofstadter partiu para uma abordagem diferente: cálculos numéricos das soluções usando um tipo primitivo de computador programável, um desktop de “apenas” 20 kg chamado HP9820A, que ele deixava rodando a noite toda. Juntando (com fita durex, literalmente!) as impressões desses cálculos, ele obteve um gráfico dos níveis de energia permitidos e proibidos, para diferentes intensidades do campo magnético.
A “borboleta de Hofstadter”, como ficou conhecido esse gráfico fractal, continha pistas cruciais para a resolução do problema, mas sua análise rigorosa estava apenas começando. Escreverei na semana que vem sobre essa saga, que tem como um dos protagonistas um jovem matemático brasileiro chamado Artur Avila.
LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.


