O último tango em Bruxelas - 19/12/2025 - Economia

O último tango em Bruxelas – 19/12/2025 – Economia

Pela janela do restaurante em Madri, viam-se as folhas amarentas do Parque do Retiro. Negociadores brasileiros e espanhóis brindavam —entre resultados promissores e excelentes Riojanos— à previsão de que, no máximo em dois anos, o acordo Mercosul-União Europeia estaria assinado. Era maio de 2010.

Nos quatorze anos seguintes, os brindes se repetiram —os resultados nem tanto. O acordo continua sendo um eterno quase. Nesta semana, tudo parecia alinhado: vontade política, texto consolidado, salvaguardas agrícolas e uma cerimônia para assinatura, desta vez numa verdejante Foz do Iguaçu.

Mas Giorgia Meloni, em cima da hora, embaçou o cronograma. A Itália pediu mais tempo, pressionada por seu agro que —subsidiado, ineficiente e protecionista— segue temendo qualquer concorrência.

A Alemanha alertou, com razão: mais um adiamento pode aniquilar o acordo de vez. De fato, o alinhamento político de hoje não se repetirá facilmente. As constantes eleições e a instabilidade global tornam tudo mais incerto.

Do lado do Mercosul, há consciência de que se negociou o que era possível. O texto final, embora modesto em acesso de mercado e limitado em agricultura, é equilibrado. Foi moldado em sucessivos ciclos de revisão técnica e política.

Para o Brasil, o acordo seria um divisor. Não apenas pelos ganhos comerciais e de investimento, mas pelo compromisso com regras e instituições internacionais, num momento em que o comércio virou instrumento de poder, e não de eficiência. Em tempos de guerra tarifária, desglobalização seletiva e louvores a autoritarismo, o acordo seria fator estabilizador.

Diante desta obviedade, a resistência europeia é explicada menos pela análise econômica e mais pela sociologia política. Os agricultores da Baviera, Emilia-Romagna ou Auvergne ainda veem o acordo como uma ameaça difusa, ignorando as quotas restritas, controles fitossanitários e salvaguardas a lhes proteger. E, com o risco de ascensão da extrema-direita, não há político europeu disposto a enfrentar protestos rurais.

A resposta do Mercosul deve ser estratégica: direcionar a agenda comercial para parceiros mais pragmáticos, sobretudo na Ásia. Lula e Milei, apesar dos antagonismos evidentes, convergem aqui: querem ampliar mercados, atrair investimentos e mostrar que suas economias não estão isoladas. Serão lembrados, neste capítulo da História, como os que tentaram salvar o Atlântico de virar periferia geopolítica.

Se fracassarem, não será por falta de esforço. Será porque a Europa, rendida a poucas dúzias de paisanos demagógicos, preferiu dançar um tango solitário em Bruxelas. Ao som da sanfona gaulesa —e ao custo da sua própria credibilidade como ator global.

Sócio do Barral Parente Pinheiro Advogados e ex-secretário de Comércio Exterior



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