Reinaldo Azevedo

parte da imprensa jogou o miolo e comeu a casca da banana

COMO ENTENDER UMA BANANA?Não apelo aqui ao texto de Gândavo só para fazer uma graça com a banana, cuja casca, crua, Romeu Zema, governador de Minas, comeu dia desses com o intuito de parecer irônico e espirituoso. Não! É que a descrição que o português faz da fruta evidencia como as pessoas, diante do inédito, preferem apelar àquilo que já sabem, ou que julgam saber, para tratar do novo ou do inesperado. Ou, pior, na ânsia de repetir aquilo que julgam saber, fazerem juízos despropositados.E como Gândavo via a banana? Segue na grafia original:”Ha na terra tantos destes caroços que os medem aos adqueires. Tambem ha huma fruita que lhe chamão Bananas, e pela lingua dos indios Pacovas: ha na terra muita abundancia dellas: parecem-se na feição com pepinos, nascem numas arvores mui tenras e não são muito altas, nem têm ramos senão folhas mui compridas e largas. Estas bananas crião-se em cachos, algum se acha que tem de cento e cincoenta pera cima, e muitas vezes he tam grande o peso dellas que faz quebrar a arvore pelo meio; como são de vez colhem estes cachos, e depois de colhidos amadurecem, e tanto que estas arvores dão huma fruita, logo as cortão porque não frutificão mais que a primeira vez, e tornão a rebentar pelos pés outras novas. Esta he huma fruita mui sabrosa e das boas que ha na terra, tem huma pelle como de figo, a qual lhes lanção fora quando as querem comer e se come muitas dellas fazem dano á saude e causão febre a quem se desmanda nellas. E assadas maduras são muito sadias e mandão-se dar aos enfermos. Com esta fruita se mantem a maior parte dos escravos desta terra, porque assadas verdes passão por mantimento e quasi tem sustancia de pão. Ha duas qualidades desta fruita huma são pequenas como figos berjaçotes, as outras são maiores e mais com pridas. Estas pequenas têm dentro em si huma cousa estranha, a qual he que quando as cortão pelo meio com huma faca ou por qualquer parte que seja acha-se nellas hum signal á maneira de Crucifixo, e assi totalmente o parecem.”RETOMOPensemos numa banana, mesmo nas minúsculas. Não nos ocorreria compará-las a pepinos ou a figos (destaques em vermelho). Mas era o que o autor tinha de mais próximo na sua experiência. E, como não poderia deixar de ser, parece que ele encontrou um sinal cristão quando o fruto era cortado ao meio.Leu-se na entrevista de Lula não o que ele disse, mas o que achavam que iria dizer. Como o presidente articulou uma fala moderada, optou-se pela leitura que já estava pronta, ignorando-se o elemento novo, que alivia tensões. E se chegou mesmo a atribuir a ele o que não disse porque desautorizado pelo texto e pelo contexto, como o crucifixo que Gândavo viu na rodela de banana. Vamos ler. Lula vai ligar para Trump? Respondeu:”Eu não liguei porque ele não quer telefonema. Veja, eu não vou entrar na análise de por que o Trump falou aquilo. (…) Veja: eu não tenho por que ligar para o presidente Trump porque, na carta que ele mandou, ele não fala em nenhum momento em negociação; o que ele faz é novas ameaças: se nós taxarmos os produtos dele, ele vai aumentar a taxação. É isso o que ele fala.”E foi o que escreveu, não? Num outro momento, ao abordar a questão da soberania, disse:”Um presidente da República não pode ficar se humilhando para outro. Eu respeito todo mundo. Eu exijo respeito comigo”.Já escrevi aqui sobre Lula ligar ou não para Trump. Deve? Depende. Desde que as negociações avancem. O presidente não está a tratar de uma questão pessoal, como se tivesse dito que ele, indivíduo, não aceita ser humilhado — o que, de resto, não faria sentido mesmo. Trata-se da relação entre países. Depois daquela carta e de outras manifestações da Casa Branca hostis ao governo brasileiro e ao Poder Judiciário, uma conversa sem uma pauta definida seria um desastre — como desastrosas foram todas as interações pessoais de Trump com chefes de Estado, independentemente da importância econômica dos países ou blocos que representavam. O conservador Narendra Modi, primeiro-ministro da Índia, por exemplo, foi um dos primeiros líderes a visitar a Casa Branca nesse mandato. Trump decidiu elevar a tarifa dos produtos indianos de 25% para 50% porque exige que o país pare de comprar petróleo da Rússia.



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