Integrantes do STF (Supremo Tribunal Federal) aceitaram o projeto da redução de penas aprovado pelo Congresso Nacional ainda que tenham feito críticas públicas. Uma das razões é o fato de uma ala do tribunal entender que os efeitos da proposta não serão automáticos para todos os réus, incluindo Jair Bolsonaro (PL), mas avaliados caso a caso, a critério do relator, ministro Alexandre de Moraes.
A ideia de uma anistia ampla, defendida por apoiadores do ex-presidente, era totalmente rejeitada pelos magistrados. Mas, à medida que essa proposta inicial não teve o apoio necessário para avançar no Legislativo, ministros e parlamentares estabeleceram um diálogo em torno dos contornos do texto que foi aprovado nesta semana no Legislativo.
De acordo com dois ministros, assessores de magistrados da corte e pessoas próximas ao tribunal e às discussões ouvidos pela Folha, uma ala do STF participou de conversas para a construção do texto tanto na primeira etapa, quando tramitou na Câmara, e depois, com o envio ao Senado.
Essa participação de magistrados, segundo as pessoas consultadas, envolveu sugestões concretas para a redação, que partiram até mesmo de Moraes. Procurado pela reportagem por intermédio da assessoria de comunicação do tribunal, o gabinete do ministro não respondeu.
Apesar desse envolvimento de ministros na discussão do texto aprovado pelo Congresso, integrantes da Primeira Turma, encarregada de julgar a trama golpista, deram declarações contra a possibilidade de atenuação das punições impostas aos condenados, seguindo uma avaliação interna de que era preciso fazer defesa do trabalho da corte ao longo dos últimos anos.
Na terça (16), Moraes criticou a redução de penas no fim do julgamento que condenou, por unanimidade, o ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal Silvinei Vasques e outros quatro integrantes da trama golpista.
“Não é possível mais discursos de atenuante em penas, em penas aplicadas depois do devido processo legal, aplicadas depois da ampla possibilidade de defesa, porque isso seria um recado à sociedade de que o Brasil tolera ou tolerará novos flertes contra a democracia”, disse.
Ele declarou ainda que a fixação das penas serve tanto para condenar os réus quanto para prevenir que novas tentativas de rupturas democráticas ocorram no futuro.
“Prevenir, deixar bem claro que não é possível mais que se tome de assalto o Estado, Ministério da Justiça, Ministério da Defesa, Gabinete de Segurança Institucional, Abin [Agência Brasileira de Inteligência], se tome de ação a Polícia Rodoviária Federal, para tentar que um determinado grupo, que, repito, se transformou numa verdadeira organização criminosa, queira se manter no poder eternamente, com esses discursos de que a sociedade está a exigir a manutenção deles no poder”, disse.
Flávio Dino, presidente do colegiado, afirmou ser importante levantar dados sobre tamanho de penas impostas aos réus. Segundo o ministros, há distorções no discurso público sobre o tema.
“Houve pleno atendimento ao princípio da individualização da pena”, disse Dino.
Naquela terça, a Primeira Turma encerrou a análise dos principais núcleos da denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) sobre a trama golpista —falta apenas o quinto deles, formado apenas pelo empresário bolsonarista Paulo Figueiredo, que está foragido.
Para uma ala do STF, o texto ajudará no distensionamento institucional, até pelo entendimento de que ficará a cargo de Moraes interpretar e aplicar, caso a caso, o que prevê o projeto aprovado pelo Congresso.
Os ministros têm sido alvo de ataques pela condução e julgamento dos casos há meses, e ações policiais recentes autorizadas por ministros da corte e que miraram parlamentares acirraram a crise com o Legislativo.
O chamado PL da Dosimetria foi aprovado na quarta (17) no plenário do Senado com um placar de 48 votos a favor e 25 contra. Como a Câmara já havia aprovado a matéria, a proposta agora segue para sanção presidencial.
O presidente Lula (PT) afirmou que irá vetar o projeto. Ele também negou qualquer participação do Palácio do Planalto no acordo que viabilizou a votação da matéria no Senado.
O chefe do Executivo tem para isso até 15 dias úteis após o recebimento da matéria para o veto.
“Tenho dito há algum tempo que as pessoas que cometeram o crime contra a democracia brasileira terão que pagar pelos atos cometidos contra esse país. Nem terminou o julgamento, ainda tem gente sendo condenada e o pessoal já resolve diminuir as penas”, declarou.


