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Por Brenno Ribas, docente de Direito constitucional do UniFavip Wyden, advogado especialista em direito eleitoral
A notícia de que os Estados Unidos aplicaram a *Lei Magnitsky* contra o ministro do STF Alexandre de Moraes caiu como uma bomba no cenário político brasileiro. Para muitos, a pergunta imediata foi: o que é essa lei? E por que um magistrado brasileiro, em pleno exercício de suas funções, foi alvo de um dos instrumentos mais duros da política externa americana?
A *Lei Magnitsky* tem uma origem trágica e simbólica. Foi criada inicialmente em 2012 para punir autoridades russas envolvidas na morte do advogado *Sergei Magnitsky*, que havia denunciado um esquema bilionário de corrupção no Estado russo. Ele foi preso, torturado e morreu na cadeia. A comoção gerou uma resposta inédita: os Estados Unidos criaram uma legislação para bloquear bens e aplicar sanções a qualquer estrangeiro acusado de graves violações de direitos humanos ou corrupção sistêmica.
Com o tempo, a lei foi ampliada e passou a ter alcance global. De lá para cá, foi usada contra militares de Myanmar, autoridades chinesas, oligarcas russos e envolvidos no assassinato do jornalista saudita Jamal Khashoggi. Até aqui, parece uma medida justa e até necessária diante da impunidade em muitos países. Mas… e quando essa lei é usada contra um ministro da Suprema Corte de um país democrático?
É exatamente esse o ponto delicado que envolve o caso de Alexandre de Moraes. Segundo o Departamento do Tesouro dos EUA, ele teria conduzido uma “campanha opressiva” contra adversários políticos, em especial aliados de Jair Bolsonaro, como parte de uma “caça às bruxas”. O Secretário do Tesouro, Scott Bessent, acusou Moraes de abusar do poder para censurar e prender opositores — o que justificaria, na visão americana, as sanções.
Mas será que esse discurso se sustenta?
A atuação de Moraes tem sido, sem dúvida, firme e polêmica. Ele lidera inquéritos que investigam milícias digitais, tentativas de golpe e ataques ao Estado democrático de direito. Em outras palavras, age no marco legal brasileiro, com respaldo de decisões colegiadas e sob o controle de um sistema jurídico independente. Não estamos falando de um ditador, nem de um chefe de polícia secreta, mas de um ministro da mais alta corte do país, em um regime constitucional.
Aplicar uma sanção como essa a um juiz de Suprema Corte abre um precedente perigoso, O gesto não só fere o princípio da soberania nacional, mas coloca em xeque a própria credibilidade dos Estados Unidos como defensores da democracia. Afinal, ao punir Moraes por suas decisões judiciais, os EUA não estão, na prática, pressionando o Judiciário brasileiro a se alinhar politicamente com o governo Trump e seus aliados no Brasil?
Esse episódio revela algo maior: a Lei Magnitsky, embora tenha uma base legítima, pode ser usada de forma seletiva e politizada. E isso é preocupante. Porque quando uma lei internacional se transforma em ferramenta geopolítica, ela perde força moral e se transforma em instrumento de disputa ideológica.
Sim, é fundamental que abusos de direitos humanos sejam punidos — e que corruptos não encontrem refúgio financeiro no exterior. Mas isso precisa ser feito com critérios objetivos, com base em organismos multilaterais, como a ONU ou a Corte Interamericana de Direitos Humanos. E não com decisões unilaterais que mais parecem retaliação política.
No fim das contas, a pergunta que fica é: a Lei Magnitsky está servindo à justiça ou à política? No caso de Moraes, tudo indica que os interesses políticos falaram mais alto. E isso coloca em risco a credibilidade de uma legislação que, em tese, deveria proteger os direitos humanos — e não ser usada como arma em disputas ideológicas internacionais.