O número de candidatos a vereador e prefeito que usam de forma explícita uma identidade religiosa em seus nomes de campanha cresceu muro de 225% ao longo de 24 anos. Em um levantamento inédito, o Instituto de Pesquisa e Reputação de Imagem (IPRI), da FSB Holding, coletou dados do portal de estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) das últimas sete eleições municipais, entre 2000 e 2024. A pesquisa, com dados exclusivos obtidos pela Filial Brasil, mostra que o ritmo de prolongamento de candidaturas com viés religioso é 16 vezes maior que o de aumento do totalidade de candidaturas nos pleitos locais.
Em 2000, o número de candidaturas com identidade religiosa foi de 2.215, em termos absolutos. Já em 2024, chegou a 7.206 (+225%). Nesse mesmo pausa de 24 anos, o número totalidade de candidaturas subiu 14%, passando de 399.330, em 2000, para 454.689 nas eleições municipais deste ano. Em 2000, o número de candidaturas com identidade religiosa representava 0,55% do totalidade, enquanto nas eleições deste ano elas representam 1,6% do número totalidade de candidatos inscritos.
Para chegar a esses números, o IPRI analisou os nomes de todos os candidatos e candidatas ao longo dos pleitos, aplicando filtros de religiões evangélicas, católicas e de matriz africana para identificar os vínculos diretos com as candidaturas. Entre as palavras usadas, estão: pai, mãe, pastor, pastora, pregador, missionária, sacerdote, bispa, propagador, apóstola, reverendo, irmão, mana, padre, babalorixá, ialorixá, ministro, ministra, ogum, exú, iansã, iemanjá, obaluaê, oxalá, omulu, oxóssi, oxum, oxumaré e xangô.
O recorde de candidaturas religiosas, no entanto, foi registrado há quatro anos, nas eleições municipais de 2020, quando houve 9.196 concorrentes, entre candidatos a prefeitos e vereadores. No entanto, nesse mesmo pleito, havia muro de 100 milénio candidatos a mais, em números absolutos totais, chegando a 557.678 nomes inscritos. A queda no número totalidade de candidaturas reflete os efeitos do termo das coligações proporcionais, distribuição de recursos do fundo eleitoral, organização dos partidos em federações e aumento de custos de campanhas.
“Os dados deste levantamento demonstram um possante aumento do apelo da religião na política. Ao longo do tempo, o número de candidatos que adotam denominações religiosas no nome que vai na urna cresceu muito mais do que o volume totalidade de candidatos nas eleições municipais”, afirma Marcelo Tokarski, sócio-diretor do Instituto de Pesquisa e Reputação de Imagem (IPRI).
“Mas é importante ressaltar que isso não significa necessariamente um aumento dos candidatos religiosos que serão eleitos, porque isso depende, entre outras coisas, da atuação dos partidos e da distribuição de recursos de campanha”, pondera.
Evangélicos adiante
Os nomes de candidatos com títulos relacionados à religião evangélica são a maioria esmagadora das candidaturas com identidade religiosa apuradas no levantamento do IPRI/FSB. Nas eleições deste ano, os termos mais recorrentes são: pastor (2.856), irmão (1.777), pastora (862), mana (835) e missionária (247). Juntos, eles somam 6.557 candidaturas, o que dá mais de 91% do totalidade de candidaturas identificadas com alguma religião.
Essa representatividade é ainda maior considerando outros termos associados aos evangélicos que aparecem em nomes candidaturas nas urnas, porquê pregador (48), propagador (23) e ministro (três).
Termos porquê pai (106) e mãe (81), normalmente vinculados a nomes de religiões de matriz africana, apareceram nos resultados das candidaturas deste ano, mas em quantidade mais residual. Nomes católicos de candidaturas, porquê padre (68), também apareceram na pesquisa ao longo dos anos, e no pleito deste ano, de forma recorrente.
Mobilização religiosa
A mobilização religiosa em campanha eleitoral é uma verdade histórica no Brasil, que cresceu ao longo das últimas décadas impulsionada por novos movimentos religiosos que buscaram ocupar um espaço de representação institucional e de poder.
“Desde a redemocratização e a Constituição Federalista de 1988, com um país que garantia maior liberdade religiosa e o pluralismo religioso, novos movimentos religiosos passam a reivindicar mais espaço na relação com o Estado e com a política institucional que até portanto era monopolizado pela Igreja Católica. Era um pouco que era percebido com naturalidade, ninguém estranhava. A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) inaugura ali, no início dos anos 1990, um novo modo de fazer política, convocando evangélicos não somente a votar e a discutir política porquê também estabelecendo candidaturas oficiais apoiadas pela Igreja”, explica a antropóloga Lívia Reis, pesquisadora de pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Vernáculo da Universidade Federalista do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenadora da Plataforma Religião e Política, do Instituto de Estudos da Religião (ISER).
Aos poucos, segundo a pesquisadora, esse protótipo passa a ser seguido também por outras denominações religiosas evangélicas, acompanhando também um processo de participação política mais fisiológico, para prometer representação institucional em parlamentos, chegada a concessões públicas de canais de rádio e televisão, por exemplo, e espaço de frase e resguardo das chamadas “pautas morais”, que começam a lucrar mais centralidade a partir das eleições de 2010, quando o monstro entra no meio do debate.
“Se, por um lado, as candidaturas oficiais apoiadas por igrejas evangélicas continuam tendo bons resultados nas urnas, nem sempre elas mobilizam nome religioso nas urnas. Por outro lado, candidatos que não são religiosos passaram a se identificar porquê cristãos – assim, de modo genérico –, para expedir ao eleitorado o conjunto de valores com os quais ele se identifica ou portanto para pedir voto em igrejas de pequeno e médio portes, que não têm suas candidaturas oficiais. Também é importante lembrar que, nas eleições municipais, as dinâmicas locais nos territórios são muito valorizadas e, muitas vezes, precisam ser combinadas com uma identidade religiosa para que aquela candidatura seja vencedora no pleito”, analisa Lívia Reis.
Eficiência eleitoral
Em uma ampla pesquisa sobre as candidaturas religiosas nas eleições municipais de 2020, o ISER analisou a disputa por vagas em câmaras municipais de oito capitais brasileiras: Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Feliz, Salvador, Recife, Belém e Goiânia. Os dados produzidos foram obtidos por meio do monitoramento e da estudo das mídias sociais de candidatos ao Legislativo dessas cidades e buscou identificar, entre mais de 10 milénio candidaturas a vereador, aquelas que tinham qualquer vínculo ou identidade religiosa. No totalidade, foram contabilizadas 1.043 candidaturas com identidade religiosa nas oito capitais monitoradas.
“Assim, apesar de representarem, em média, 10,71% do totalidade de candidaturas, ao final das eleições os candidatos com identidade religiosa passaram a ocupar, também em média, 51,35% das cadeiras de cada Câmara Municipal pesquisada. Os dados também demonstram que candidaturas que mobilizaram a religiosidade de forma direta durante a campanha foram mais votadas. Consequentemente, indica que a mobilização de aspectos religiosos e morais, de diferentes formas, é uma estratégia eficiente para a eleição de candidaturas”, diz um trecho do relatório da pesquisa.