Na véspera do feriado da Independência, quando o Brasil completará 202 anos de rompimento formal com o colonialismo, o intelectual preto luso-senegalês Mamadou Baila Ba – uma das mais proeminentes vozes antirracistas em Portugal – questiona a teoria de independência onde há racismo.
“Não é provável ser independente em um mundo racista”, diz o ativista, que participou, na quinta-feira (5), do 2º Congresso Internacional de Estudos Afrodiaspóricos, promovido pelo Serviço Social do Transacção (Sesc), no Rio de Janeiro.
A enunciação foi feita ao ser perguntado pela Escritório Brasil se a população negra brasileira pode se considerar independente. Mamadou Ba estendeu a opinião dele para qualquer lugar do mundo em que haja racismo. E citou o período da pandemia de covid-19, iniciada em 2020, porquê exemplo.
“Quem foram os soldados da guerra contra a pandemia? Foram os corpos negros. Foi o tropa mobilizado para que a economia não parasse. No mundo ocidental foi muito evidente. Os trabalhos essenciais da economia, quem os sustentou? Distribuição, unidades fabris, supermercados, quem? Corpos não brancos. Em todos os lados do mundo, é global”, afirmou o intelectual, que fez sinal de aspas ao usar a vocábulo “essenciais”.
“Sociedades pós-coloniais são sociedades de subordinação cromática, nas quais a teoria de raça, porquê traço de definição de pertencer à humanidade, permanece. Enquanto ela não for derrotada, as pessoas negras não serão independentes”, acrescentou o ativista que nasceu no Senegal, na África, e foi morar em Portugal, onde adquiriu a dupla cidadania.
Lição magna de Mamadou Baila Ba, no 2º Congresso Internacional de Estudos Afrodiaspóricos, no Rio – Tânia Rêgo/Escritório Brasil
Mamadou Ba é tradutor e formado em língua e cultura portuguesas. Desde 1999, está avante do movimento internacional SOS Racismo. Em 2021, foi um dos vencedores do prêmio Front Line Defenders, que reconhece trajetórias de defensores de causas ligadas aos direitos humanos no mundo todo, porquê combate ao racismo e empoderamento de minorias.
O intelectual defende que a vocábulo escravidão seja sempre grafada com “e” maiúsculo, para marcar que foi um violação contra a humanidade, assim porquê um genocídio.
Segundo ele, a população afrodiaspórica, ou seja, formada por negros escravizados que foram retirados à força do continente africano e seus descendentes, conseguiu produzir uma identidade que serviu para tutelar essa população, uma forma de “aquilombamento”.
“Se não tivéssemos nos estremecido, não teríamos sobrevivido”, sentencia. “Um dos principais atributos da identidade diaspórica foi transformar memória em resistência. O aquilombamento serviu para nos tutelar.”
Mamadou Ba defende que a identidade afrodiaspórica deve buscar, mais do que paridade, a soberania.
“Uso pouco a vocábulo paridade. É uma questão de estratégia para mim. Não quero ser igual a ninguém. Quero ser respeitado. Paridade é uma consequência do reverência”, diz o ativista.
Para ele, uma forma de ocupar o reverência e reconhecimento passa por mudanças nos currículos escolares.
“É preciso descolonizar os currículos. Não queremos reescrever a história, queremos grafar a nossa história. Não é questão de sectarismo. É questão de asserção”, disse ele, que exemplificou uma iniciativa do país natal, Senegal, onde algumas escolas ensinam a língua de povos originários. “A língua é uma utensílio de poder.” Senegal foi colônia francesa, sendo o gaulês o linguagem solene.
O ativista luso-senegalês é protector do pan-africanismo, que classifica porquê uma proposta política para liberar qualquer pessoa oprimida. Em vários momentos da lição magna, faz uso de citações do filósofo preto gaulês Frantz Fanon (1925-1961), renomado responsável da traço de pesquisa sobre pós-colonialismo, que estuda impactos sociais, psicológicos e estruturais do racismo.
“Fanon dizia que ‘ser preto define o lugar que ocupo na sociedade racista’”, citou.
O congresso organizado pelo Sesc RJ segue até o próximo sábado (7). A programação inclui uma série de atividades, porquê palestras, rodas de conversas e oficinas. O público pode se inscrever para participar, de forma gratuita. Nesta sexta-feira (6), Mamadou Ba lançará o livro Antirracismo: nossa Luta é por Reverência, Paixão e Honra.
A crítico de cultura do Espaço Arte Sesc, Ara Nogueira, explica que trazer um técnico em diáspora africana para falar sobre o ponto em um país tão marcado pelo racismo, porquê é o Brasil, é uma forma de pensar transformação social e do mundo sem viés colonizador.
“Não trazer a narrativa só de sofrimento, de dor, mas de transformação, força, potências, sensibilidade. Uma construção de vida que passa pela construção de arte, intelectualidade, processos de tirocínio e de saberes.”