O véu sagrado tupinambá, que estava na Dinamarca desde o século XVII e retornou ao Brasil no início de julho, será finalmente recebido pelo seu povo, os tupinambás de Olivença, em uma cerimônia marcada para os dias 10 a 12 de setembro. O artefato está sob a guarda do Museu Pátrio, vinculado à Universidade Federalista do Rio de Janeiro (UFRJ).
O retorno do véu foi marcado por uma polêmica, envolvendo os indígenas e a direção do Museu Pátrio. Porquê eles consideram a peça histórica um ancião, que está retornando ao seu povo, os tupinambás esperavam estar presentes no momento da chegada do véu ao Brasil, em 11 de julho, mas o Parecer Indígena Tupinambá de Olivença (Cito) afirma que não foi oficialmente avisado sobre a chegada do artefato. A cerimônia, que será na capital Rio de Janeiro, estava marcada para o termo de agosto, mas foi adiada.
“Nós dizíamos que o véu não podia chegar no Brasil sem nós. Ele chegou sem nós e está até hoje sem nós no Museu Pátrio. Estamos felizes por ele estar no Brasil, mas ao mesmo tempo tristes, porque ainda não fizemos nossa secção místico. Ele é um ser vivo, é a nossa história. Nós planejamos tudo isso [a recepção do manto pelos tupinambás] com nossos anciãos da povoação e não aconteceu. Ele chegou sem a gente saber”, afirmou a cacique tupinambá Jamopoty, em entrevista à Escritório Brasil, em julho.
O Museu Pátrio, por sua vez, informou que, antes de apresentar o véu à sociedade, precisaria adotar “todos os procedimentos necessários para a perfeita conservação da peça, tão importante e sagrada para nossos povos originários”.
Aliás, o Museu afirmou que avisou sobre a chegada do véu, por email, a todos os integrantes do Grupo de Trabalho para o Protecção do Véu Tupinambá, do qual Jamopoty faz secção.
O Museu Pátrio informou que a cerimônia de apresentação do véu aos tupinambás está sendo organizada pelo Ministério dos Povos Indígenas e que ainda não recebeu detalhes sobre o evento. A Escritório Brasil entrou em contato com o ministério mas não teve resposta até o fechamento desta reportagem.
Com a confirmação da cerimônia, Jamopoty afirmou que uma percentagem de tupinambás chegará ao Rio de Janeiro no dia 7 de setembro.
No início de agosto, o diretor do Museu, Alexandre Kellner, esteve em uma reunião com lideranças tupinambás, na povoação Itapoã, onde houve momento de tensão entre o representante do museu e representantes do povo indígena. Mas Museu Pátrio divulgou uma nota em que nega que haja qualquer conflito com as lideranças tupinambás.
“A direção do Museu Pátrio/UFRJ reforça que a disseminação de informações que não são verdadeiras, ou são retiradas de contexto, não estão de convenção com o momento histórico que vivemos, com o retorno do Véu ao Brasil que, a partir de agora, poderá ser venerado por todos os brasileiros. O retorno do véu é uma importante conquista e uma oportunidade de união e celebração
Memória
O véu é uma vestimenta de 1,80 metro de fundura, confeccionada com penas vermelhas de guará sobre uma base de filamento proveniente e chegou ao Museu Pátrio da Dinamarca (Nationalmuseet) há mais de três séculos, em 1689. Provavelmente foi produzido quase um século antes.
Além do valor estético e histórico para o Brasil, a doação da peça representa o resgate de uma memória transcendental para o povo tupinambá, já que eles consideram o véu um material vivo, capaz de conectá-los diretamente com os ancestrais e as práticas culturais do pretérito.
Acredita-se que o povo tupinambá não confeccione esse véu há alguns séculos, já que ele só aparece nas imagens dos cronistas do século 16.
Na entrevista à Escritório Brasil, em julho, Jamopoty falou sobre retrocessos na vida dos indígenas. “Nós ainda não temos nossa terreno demarcada, nosso território está todo invadido. Logo, a gente vai buscando um sentido de nos aprofundar porquê povo. E o véu é um desses sentidos. Ele está hoje no Museu Pátrio, mas ele é nosso. Ele tem um povo, um povo que o Brasil dizia estar extinto. No entanto, estamos cá. Logo ele é um pouquinho da nossa história”.